quinta-feira, 29 de março de 2012

QUADRINHOS S.A. - Uma Década escrita a Grafite e Nanquim



Já faz tempo.
Há vários verões lembro de ter ouvido falar dos caras que faziam a revista Quadrante X. Eu integrava outro grupo de quadrinhistas, que na época via com desdém o trabalho na publicação mencionada acima, e eu partilhava dessa opinião. Por quê?
Pelos motivos babacas de sempre: "Não tá que nem a Marvel", "Falta ação na revista", "Tá nacional demais", etc.
Tempos mais tarde, o outro grupo de quadrinhistas desfeito, e eu em meio a fanzines autorais, e o quadrinhista Rafael Grasel certa vez viu meus desenhos antes da exibição de um filme no Ciclo de Cinema Histórico da UFSM.
Sendo assim, em 2007 fui convidado a integrar o Quadrinhos S.A.. 
A memória logo trouxe a impressão negativa de outrora, mas sei lá por qual razão, o tempo livre favoreceu a visita à Casa de Cultura, que servia e ainda serve de base de operações pros caras.
A opinião negativa? Manteve-se.
No entanto, algo muito simples possibilitou rever a questão: em cerca de 1 mês e meio que eu freqüentei a sala com as paredes que parecem um sketchbook, o Quadrinhos S.A. organizou duas ações quadrinhísticas (só pra complementar, e mostrar que sou eficiente em lembrar assuntos de relevância questionável pela sociedade, foram a Panfletagem Contra a Aids, e a Exposição de cartuns "Traçando Noel").
Simples, conforme eu disse, porém foi o que resultou minha participação em uma expo de quadrinhos, e meu primeiro trabalho publicado em jornal.
Além disso, o mais importante foi a constatação de que se todos os outros quadrinhistas que havia conhecido até então ficavam quarenta anos dizendo que não publicavam nada e não organizavam nenhum evento por falta de apoio, o Quadrinhos S.A. juntaria as moedas dos bolsos dos integrantes se as tentativas pra angariar patrocinadores não surtissem efeito.
Minha opinião então mudava no que tange ao grupo iniciado com uma convocação do lendário quadrinhista Byrata, que em 21 de março de 2002 reuniu os desajustados nerds, quadrinhistas, e afins, que tinham o interesse em ver o quadrinhismo além de comprar HQ na banca, ler, e guardar na estante.
E de um grupo com número relativamente grande de pessoas, em breve restaria um seleto time de autores que tinham por principal talento artístico a tolerância à incomodação.
Logo surgiria o fanzine Quadrante X de número zero, reunindo HQs, charges, e o que mais pudesse preencher as páginas da edição. 
E não sendo o Quadrinhos S.A. o emprego de ninguém, novas mudanças na formação do coletivo viriam, fosse pra alguém se dedicar mais à família, estudos, trabalho formal, ou simplesmente porque insistir em uma arte tão contestada, e tendo detratores até mesmo entre outros quadrinhistas é algo inglório demais pra muita gente.
Ainda assim, por algum motivo que seguidamente discutimos sem nenhuma solução, tornou-se hábito  nosso prosseguir com a teimosia de realizar eventos, tornar-se um grupo mais organizado, buscar  aprender mais sobre a nona arte para escrever e desenhar melhores histórias, mesmo sem saber se o trabalho que custou as horas destinadas ao convívio com a família, ou aos compromissos, terá aceitação do público.
E isso especialmente pois o que há de mais válido na iniciativa deste Núcleo de Quadrinhistas de Santa Maria era o mesmo que eu aprendi a criticar antigamente. Não era igual aos quadrinhos estrangeiros e nem era pra ser, afinal, a diversidade quase caótica  da arte dos integrantes, e logicamente das páginas da revista, e que poderia ser a fragilidade de um coletivo, no Quadrinhos S.A. era sua verdadeira força.
E se tal objetivo corria o risco de passar a eternidade na condição de um discurso louvável, porém repudiado pelos leitores, tem demonstrado exatamente o contrário, com receptividade e reconhecimento cada vez mais significativo pelo país.
Hoje, meu entendimento é que, independente de gostos e interesses pessoais quanto a entretenimento, o próprio lançamento da publicação, resistindo a todo esse tempo e complicações inerentes deveria servir de incentivo a outros autores, que muitas vezes ficam esperando um editor aparecer na porta de casa por ter curtido alguma obra sua nunca publicada em meio impresso ou digital.
A jornada por uma identidade plural e sempre mutável de arte sequencial certamente não é a alternativa plenamente comercial que muitos recomendariam.
Mas quem liga?
Ainda que tenha ganhado novas cores, e tenha feito uma plástica no rosto, a Quadrante X ainda é um fanzine em sua essência, e o Quadrinhos S.A. permanece o grupo de caras que apreciam quadrinhos e se reúnem pra falar disso uma vez de semana, e consequentemente não envelhecer.
Então, não se engane pelo fato de que a Núcleo de Quadrinhistas tenha completado uma década de existência na semana passada.
Pro Quadrinhos S.A. esses dez anos não representam rugas na cara, ainda que tenham trazido um monte de experiência.
Depois de mais de 20 publicações com a arte dos integrantes, estimadas 22 exposições, workshops, etc, produzir quadrinhos continua sendo a mesma diversão de guri, riscando e arriscando novos jeitos de contar os roteiros, se incomodando e rindo disso quando o trabalho estiver pronto,  curtindo sempre que um leitor vem elogiar uma história, e sabendo que, se fosse diferente não ia valer a pena.


2 comentários:

VELOSO disse...

Parabens pela caminhada!

Marcel Ibaldo disse...

Valeu.
A jornada tá recém começando.